A maioria dos fãs de Harry Potter já se fez a mesma pergunta: E se Harry Potter fosse brasileiro? Uma brincadeira como essa foi feita no twitter, quando Relíquias da Morte estava em vias de ser lançado. Lembro que uma das melhores frases que vi foi a seguinte: Harry seria negro, pobre, estudaria em escola pública e, provavelmente, os professores iriam faltar muito às aulas.
Foi mais ou menos com essa ideia – juntando a deixa de J. K. Rowling – que Renata Ventura, autora carioca, escreveu A Arma Escarlate. Eu já havia lido algumas resenhas sobre o livro, algumas com um positivismo excessivo, outras com um negativismo nunca visto antes. Por isso, para tirar a dúvida, resolvi pegar o livro e tirar a minha prova dos nove: o resultado ficou dentro do esperado.
O ano é 1997. Um garoto negro, morador do morro de Dona Marta – naquela época, uma das favelas mais perigosas do Rio de Janeiro – chamado Idá Aláàfin Abiodun, está trabalhando como vigia de Vip, traficante de drogas que tomava conta do morro, quando ele recebe uma carta de uma escola bruxa chamada “Nossa Senhora do Korkovado”. Ameaçado de morte por ter delatado o traficante, Idá foge para a escola, disposto a aprender magia o suficiente para atacar e se vingar de Caiçara, um dos bandidos que infernizaram sua vida.
A partir daí o garoto tornando-se Hugo, então a história começa...
As semelhanças com Harry Potter estão apenas no formato da obra, pois é impossível ler e não se lembrar da saga. Até a própria autora fez questão de dedicar o livro a J.K Rowling “a bruxinha boa que nos deu um mundo novo” e que lhe inspiração para escrever a obra.
A história é deveras interessante, tanto que o protagonista tem mais cara de antagonista, e o coadjuvante tem cara de protagonista! Sim, essa é a mais pura verdade.
Hugo ou Idá, a personagem principal, é um garoto de 13 anos chato! Muito chato, egoísta e egocêntrico: para ele tudo e todos conspiram contra sua existência. Ainda que a narrativa seja em terceira pessoa, tudo gira em torno de uma única perspectiva: Hugo.
Todas as ações descritas são muito bem narradas, tanto que você consegue sentir um misto de pena e ódio. Admito que, diversas vezes desejei que ele morresse, sumisse ou levasse uma surra tão grande que o deixasse aleijado.
De verdade, em todo esse tempo de leitura, nunca detestei tanto um protagonista como detestei o Hugo.
Porém, o narrador tenta, de todas as formas, explicar os atos do garoto, e as justificativas são até certo ponto válidas, afinal de contas ele só tem 13 anos, vive sem nenhuma perspectiva, morando dentro de um container que é assolado diariamente por balas de fuzis, além das constantes ameaças de morte que sofre.
Ademais, seu pai sumiu antes do seu nascimento e ele tem que se defender e proteger sua mãe e Abaya (sua avó) de alguma forma! Logo, o seu comportamento é justificável por sua autodefesa e fragilidade.
Em contrapartida, temos uma segunda personagem que chama bastante atenção: Ítalo ou Capi, o garoto é um anjo! De verdade, se eu de fazer uma lista de personagens favoritas, com certeza, Capí estaria incluído! O mesmo rapaz que é o que mais vai ajudar Hugo de diversas maneiras –, porque o nosso protagonista se mete em cada confusão que só vendo!
O livro é dividido em duas partes: na primeira, temos o primeiro contato com Hugo e seu cotidiano na favela e na escola. Acompanhamo-lo no conhecimento que ele vai adquirindo aos poucos, até o momento em que surge uma leve mudança no comportamento arisco do garoto; a segunda parte é onde a história realmente toma forma e aí sim, toda a comparação que teria com Harry Potter sai pela culatra.
A Arma Escarlate é totalmente ambientado no Brasil. Acredito que a autora tenha gasto muito tempo em pesquisas sobre costumes e nomes da cultura afro-brasileira, e essa jogada é genial e inteligente!
Todos os feitiços são ditos em idiomas tupiniquins ou com alguma palavra de origem africana, os personagens são bem brasileiros.
Ao invés de um Hagrid fofo e agradável como professor de trato de criaturas mágicas, temos uma professora que adora explorar animais; no lugar de jogos de quadribol, temos zênite, que se parece muito mais com futebol! Bolo de abobora? Que nada! O negócio é comer feijoada na beira da praia! E sim, a escola fica à beira do mar.
Folclore brasileiro se mistura com o misticismo africano, parece loucura não é? Mas, acreditem, essa mistura deu certo! Além de tudo isso, ainda temos algumas referências ao próprio Harry Potter, Senhor dos Anéis e até Crepúsculo! Isso mostra a veia nerd da autora.
O livro é interessante, sim vou repetir; mas, para ser aproveitado, o leitor precisa estar livre e aberto de preconceitos e outras coisas! Esse livro foi feito para ler desprendido de tudo: apenas abra, sente-se no sofá e leia! As primeiras páginas são bem complicadas e então, pode ser que ele se torne entediante; contudo, passando delas, para chegar ao meio do livro é em um pulo, porque o leitor se surpreende! Eu me surpreendi!
Algumas personagens são realmente deliciosos e corajosos, como eu já falei do Capí, ainda tem o Viny, Gisleine e o fofo do Eimi.
A escrita de Renata Ventura é formosa, simples! E a forma de como ela escreve é fantástica! E os diálogos são interessantes, porque até o sotaque, ela fez questão de colocar no livro e você consegue até ouvi-los falando.
Vale a pena ressaltar também a critica que a autora faz a educação brasileira, mostrando que não importa se a escola é de bruxaria, os problemas são os mesmos: desde os professores que não ensinam nada, ao uso explícito de drogas e a maneira como elas invadem o ambiente escolar e como os jovens tornam-se vulneráveis a esta situação.
Fiquei muito surpresa com A Arma Escarlate, uma literatura que não é maravilhosamente ótima, mas também não é ridicularmente ruim como muitos disseram. É boa e vale a pena ser lida. Tem seu próprio rumo, caminha sozinha, se faz sozinha!
Sobre a Autora:
Ana Caroline é estudante de Letras Português Francês na Universidade Federal de Sergipe. Adora ler, é apaixonada por séries da Literatura de Fantasia e espera desenvolver um trabalho de pesquisa sobre esse tema na faculdade. Trabalha em uma livraria, onde o contato diário com os livros levou a desejar criar esse blog. Escreve no Loucuras de Caroline. |
Sem brincadeiras, eu não sei como alguém pode não falar bem do livro. Ok não curtir, achar chato. Cada um tem o seu próprio gosto e nisso ninguém se mete. Mas é fato que a autora conseguiu encaixar direitinho um mundo mágico aqui no Brasil, com bastante originalidade. Adorei como ela faz várias críticas à algumas situações daqui sem degenerar a imagem do país, muito pelo contrário.
ResponderExcluirE o Hugo foi feito para ser assim mesmo!! Também morri de raiva da pessoa, quis colocá-lo contra a parede e dizer umas boas verdades. É por isso que eu gostei tanto dele, ou pelo menos da personalidade, tão diferente da do Harry.
Vale à pena ser lida mesmo! :D
Eu vim aqui procurando mais sobre esse livro, realmente não o conhecia. Não acredito que passei tanto tempo sem saber da existência dele.
ResponderExcluirNão sei mais nada a n]ao ser sua crítica, mas a curiosidade está a livro máximo. Creio que trazer a história pro Brasil é realmente incrível, mas acho que algumas regras devem ser seguidas, já que o mundo continua sendo o da J. K. Rowling. Adorei isso de nomes africanos, mas acho que os feitiços não variam de uma língua para outra.
Realmente há uma escola de magia e bruxaria no Brasil, não é? É citado no Cálice de Fogo. Isso me deixa muito mais ansioso!
Abraços,
Estou lendo ele, a história tá até boa por enquanto, mas algo que me incomoda muito é as referências que ela faz a Harry Potter, a Hogwarts e tal, tipo se ela tá usando esse mundo que foi criado pela J.K, Ela devia usar ele como base, mas ela muda tanta coisa e as explicações não convence, tipo o cara no começo do livro vendendo Horcrux no subsaara como se fosse uma coisa que se vende assim, (pra dividir a alma tem que matar) ou tipo, não dá pra aprender os feitiços em latim usados na Europa pq vc explode se fizer isso, como assim ? Volta e meia ela faz alguma referência que do jeito que ela fala acaba não se encaixando nesse mundo criado pela J.K, se pelo menos as explicações fossem muito boas até daria pra aceitar.
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